“Queremos formar um cidadão pensante em nossa sociedade ou
queremos o que se deixa controlar?”
Vitória Rodrigues e Silva
Fundamento Assessoria
Com essa provocante pergunta, Rosely Sayão, uma das mais conhecidas
educadoras brasileiras, escreveu um artigo, recentemente publicado pelo jornal
O Estado de S. Paulo (6 de jun), cuja leitura julgo obrigatória. Ela vai direto ao
ponto: o que poderia explicar ou mesmo justificar o apego quase atávico de
muitas escolas a um modelo de avaliação que já sabemos não contribui para a
formação dos nossos alunos? Reproduzo aqui um trecho do artigo:
Uma boa parte dos colégios, em geral privados, tem agido de forma a
ignorar solenemente esse período pelo qual seus alunos passam. Há
escolas reprovando, apesar da recomendação contrária do Conselho
Nacional de Educação.
Mas e se o aluno não aprendeu o que a escola considera que deveria? Ora,
faltou revisão de planejamento para considerar o período de exceção que
vivemos, não é verdade? Organizar reforço escolar, mudar estratégias
didáticas remotas, usar melhor a tecnologia a favor do ensino e da
aprendizagem, por exemplo, deveriam ter sido recursos utilizados. Mas,
em geral, não foram. Faltou avaliação da escola do trabalho por ela
realizado.
E, por falar em avaliação, são incríveis os depoimentos de profissionais da
escola no texto publicado pelo Estadão com o título “Após aumento de
notas, colégios usam tecnologia e câmeras para tornar prova
online anticola”.
Gente! Mas o que é isso??? Isso significa que, em vez de buscar melhorar o
ensino remoto, debruçar-se sobre as dificuldades dos alunos para
encontrar boas soluções e de colaborar com o momento tão difícil vivido
por eles, a escola escolhe aprimorar seus mecanismos de controle sobre o
aluno e, dessa forma, pressioná-lo ainda mais. […]
Gostaria de salientar dois pontos. O primeiro, é que, em qualquer contexto,
é importante a escola rever seus planejamentos anuais, adaptando-o às
conjunturas que vão se configurando ao longo do período letivo. Isso é ainda
mais necessário no atual contexto pandêmico, em que as aulas precisam se dar
remotamente, com todas as dificuldades que já sabemos isso acarreta. Não
havia como esperar que, em um contexto tão diverso e adverso, os alunos
aprendessem as mesmas coisas que esperávamos em janeiro do ano passado
ou mesmo em janeiro deste ano. É claro que há um conjunto de aprendizagens
obrigatórias, que a escola precisa assegurar. A pergunta que ela precisa fazer é:
como vamos atingir essas metas? Apenas ampliando a pressão sobre os
alunos? Já não basta toda a que estão sofrendo? Será que é tão difícil concluir
que para as crianças e jovens, particularmente os adolescentes, esses meses
todos de pouca convivência com os amigos, acarretará marcas profundas? Eles
estão vivendo um momento fundamental de sua formação impedidos de se
socializar! Alguém desconhece que o processo de formação da identidade
depende do contato com o outro, mais precisamente, os outros?
O segundo ponto: porque a escola valoriza tanto as avaliações formais, de
caráter classificatório, é se autoavalia tão pouco? Rosely Sayão, de novo, vai ao
ponto quando afirma que a escola precisa compreender as razões da baixa
performance nas aprendizagens dos alunos, mesmo daqueles que contam com
um bom computador, internet com banda larga adequada e acesso a outros
recursos pedagógicos. Será que, apesar do uso de novas tecnologias, o modelo
de aula que predominou não foi o mesmo empregado nas aulas presenciais, em
que um professor fala, todos os alunos escutam e fazem aquilo que o professor
determina?
Muitos especialistas em educação, especialmente na área de ensino híbrido, têm
chamado atenção para o enorme equívoco de chamar essa modalidade de
ensino que temos visto nas salas de aula de ensino à distância ou ensino híbrido.
O assunto merece outro artigo, mas é muito importante reconhecer que essas
modalidades de ensino exigem outro tipo de planejamento, outras dinâmicas de
aula e, consequentemente, outro modelo avaliativo. Como querer que os alunos
tenham outro tipo de comportamento frente às provas, se tudo continuou igual,
apenas o espaço em que a aula ocorre mudou?
Os longos meses de pandemia vão deixar muitas e importantes lições. A
Fundamento Assessoria está empenhada em ajudar os educadores que estão
desconfortáveis com tudo isso a rever seus currículos, seus planejamentos e
avaliações. Não podemos perder mais essa oportunidade.